Procurador da república Deltan Dallagnol foi o coordenador da força-tarefa até 2020. (Fernando Frazão/Agência Brasil)
Clara Cerioni
Publicado em 29 de agosto de 2020 às 08h20.
A última semana foi uma das mais negativas para a Operação Lava Jato, com duas sentenças do ex-juiz Sergio Moro anuladas e com o coordenador da força-tarefa do Ministério Público Federal em Curitiba, Deltan Dallagnol, julgado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Apesar de não sofrer punição, o órgão mandou recados claros às atitudes do procurador.
Em meio a uma crise entre os procuradores da Lava Jato e Augusto Aras, o procurador-geral da República vai decidir até o dia 10 de setembro se estende a força-tarefa por mais um ano ou não. Com isso, o futuro da maior investigação contra a corrupção do país é incerto.
Claudio Couto, coordenador do Mestrado Profissional em Gestão e Políticas Públicas da FGV-SP, diz que há dois principais fatores que mostram o enfraquecimento da Lava Jato neste momento.
"O primeiro foram os excessos e a parcialidade do Moro. O segundo ponto é que há uma disputa que se trava entre o grupo da Lava Jato e o governo federal. E a partir do momento em que o Aras entrou, bateu de frente", avalia o cientista político.
Na opinião da professora de Direito Internacional da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, Larissa Ramina, a Lava Jato está passando por um momento de muito enfraquecimento, principalmente pela maneira como todo o processo foi conduzido.
"É claro que a corrupção deve ser investigada e devidamente punida, todavia, há evidente inclinação política da operação. O combate seletivo empreendido por ela contaminou todo o projeto, comprometendo de forma definitiva os resultados. Ao atuar com parcialidade, ou seja, ao favorecer uma das partes, todo o processo deve ser anulado e o julgador responsabilizado", diz.
Na última terça-feira, 25, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a parcialidade de Sergio Moro em uma ação em que ele atuou como juiz no caso Banestado, que mirou esquema bilionário de evasão de divisas entre 1996 e 2002.
O recurso foi apresentado pela defesa do doleiro Paulo Roberto Krug, condenado com base na delação premiada de Alberto Youssef. Na prática, a decisão anulou a sentença contra Krug imposta por Moro.
Pelo Twitter, o ex-juiz se manifestou dizendo que "com o empate de 2x2 no STF, fica anulada minha sentença que condenou um doleiro no caso Banestado - um marco do combate ao crime. Respeito o resultado. Antes, a condenação havia sido confirmada por 3 instâncias (Justiça Federal, TRF4 e STJ)".
Um dia depois desta decisão do STF, a Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), responsável pelos processos da Lava Jato na segunda instância, derrubou por unanimidade uma outra sentença de Moro.
Os magistrados absolveram o ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira e o presidente da empreiteira Construcap, Roberto Ribeiro Capobianco, no processo aberto a partir de provas obtidas na Operação Abismo. De acordo com o Tribunal, não havia provas suficientes para a condenação.
Para a professora de Direito da UFPR, Larissa Ramina, este tipo de anulação de sentença é muito raro. " O juiz, ao conduzir um processo e ditar uma sentença, o faz representando o Estado, e é por isso que o princípio da imparcialidade do julgador é condição fundamental", diz.
No mesmo dia em que o STF anulou uma sentença de Moro, o Conselho Nacional do Ministério Público arquivou um processo contra Deltan Dallagnol e outros procuradores da Lava Jato, por causa do PowerPoint usado na apresentação da denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2016.
A maioria dos conselheiros entendeu que seria sim cabível a abertura de um processo administrativo contra os procuradores, mas o tempo para isso estava prescrito.
Apesar do arquivamento, os conselheiros decidiram, por maioria, de que os procuradores deverão se abster de utilizar “instalações, equipamentos e recursos do Ministério Público” para fins de atividades políticas ou político-partidária.
"O CNMP saiu enfraquecido deste processo porque procrastinou a decisão e isso foi deliberado, não foi casual. Acho que nos próximos dias o Aras deve prorrogar a operação, só que por mais seis meses, e encerrar os trabalhos após este período", avalia o cientista político Claudio Couto, da FGV-SP.
(Com Estadão Conteúdo e Clara Cerioni)