Brasil

Apesar de chuvas, crise hídrica ainda é realidade em SP

Neste ano, apesar de o rodízio ter sido oficialmente descartado, as represas ainda estão em situação crítica


	Cantareira: o Sistema Cantareira opera em patamar negativo, tendo registrado -4,2% da capacidade no dia 16 de dezembro
 (Divulgação/Sabesp)

Cantareira: o Sistema Cantareira opera em patamar negativo, tendo registrado -4,2% da capacidade no dia 16 de dezembro (Divulgação/Sabesp)

DR

Da Redação

Publicado em 28 de dezembro de 2015 às 09h33.

A crise hídrica que atinge a região metropolitana de São Paulo desde o início de 2014 ainda é uma realidade para paulistanos e moradores de municípios vizinhos da capital paulista.

Neste ano, apesar de o rodízio ter sido oficialmente descartado por causa da melhora no regime de chuvas e da redução de consumo adotada pela população, as represas ainda estão em situação crítica.

O Sistema Cantareira opera em patamar negativo, tendo registrado -4,2% da capacidade no dia 16 de dezembro.

O sistema, que abastecia cerca de 9 milhões de pessoas, hoje atende 5,2 milhões, segundo dados da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).

O geólogo Pedro Luiz Côrtes, especialista em recursos hídricos da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Nove Julho (Uninove), aponta que o maior volume de chuvas, especialmente em fevereiro e março, trouxe um alento para a situação, classificada como muito crítica no final do ano passado.

“Serviu para que a gente conseguisse sair da segunda cota do volume morto e ficasse na primeira cota”, apontou.

Ele lembra, no entanto, que a situação está longe da normalidade e, para a população, as medidas de contenção continuam sendo de grande impacto.

“O governo insiste que não existe um rodízio, mas na verdade existe, porque você tem sistematicamente vários bairros que, todos os dias, ficam várias horas sem água”, disse, referindo-se à medida de redução da pressão da água na rede de tubulação.

A manobra é feita diariamente pela Sabesp em diferentes bairros, o que deixa algumas regiões sem água nas torneiras, especialmente as casas que não contam com caixas d'água.

No site da companhia, a população pode acompanhar os bairros e os horários em que serão atingidos pela medida.

O professor Luis Venturi, do departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, avalia que os problemas no abastecimento referem-se, na verdade, a uma crise hídrica gerencial.

“Decorrente da incapacidade de mantermos os corpos hídricos [rios] limpos e de tratarmos e distribuirmos toda essa água em um ritmo suficiente para abastecer a demanda”, disse.

Ele aponta que, atualmente, apesar de estarem corretas as obras feitas para interligar represas, elas já deveriam estar previstas dentro de um planejamento de curto, médio e longo prazos.

“Elas são feitas a toque de caixa para apagar o incêndio”, criticou.

Obras

A principal obra de 2015, entregue em setembro pelo governo estadual, foi a de interligação entre os sistemas Rio Grande e Alto Tietê.

Com custo de R$ 130 milhões, o córrego Taiaçupeba-Mirim não suportou o volume de água retirado da represa Billings, previsto para 4 mil litros de água por segundo.

Por conta da falha, áreas do município de Ribeirão Pires foram alagadas e foi necessário reforçar as margens. Segundo a Sabesp, hoje o bombeamento funciona normalmente, com a capacidade total de transferência.

Outra obra que reforçou a capacidade de abastecimento das represas foi a captação de água do Rio Guaió, entregue em 29 de junho.

Atualmente, ela fornece 350 litros de água por segundo para o Sistema Alto Tietê e o volume pode ser ampliado para até mil litros.

Parte desta água atende uma parcela da população que era atendida pelo Cantareira. A expectativa do governo estadual para 2016 é a recuperação contínua e gradual dos mananciais.

Estão previstos, para o próximo ano, os estudos de captação dos rios Itapanhaú e Alto Juquiá.

Cenário para 2016

O fenômeno El Niño, que contribuiu para um regime de chuvas melhor em 2015, na região Sudeste, também pode levar a um volume maior de tempestades no próximo ano.

É o que aponta estudo do Grupo de Eletricidade Atmosférica (Elat) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

“Para o verão de 2015/2016, sujeito a um evento El Niño muito forte – o atual deve ser o terceiro mais forte desde 1950, depois dos eventos de 1983 e 1998 – está previsto um aumento de 20%, em relação ao último verão, na ocorrência de tempestades na região Sudeste, ”, diz nota do grupo.

O doutor em Geofísica e coordenador do Elat, Osmar Pinto Júnior, explica, no entanto, que o volume de água depende especificamente de outro tipo de precipitação: as chuvas não convectivas.

Nesse sentido, apesar de ter um efeito no aumento das tempestades, elevando o número de raios, a contribuição para o nível das represas pode não chegar ao percentual previsto.

Côrtes lembra que, para sair do volume morto e passar o período de estiagem (a partir de abril) sem precisar da reserva técnica, seria necessário chegar a 35% da capacidade do Cantareira.

“Esse El Niño está prognosticado para terminar em maio, junho do ano que vem. A gente precisa ver qual vai ser o comportamento do clima a partir de meados de 2016 para dizer se o período de chuvas 2016-2017 vai ser bom ou não, a ponto de continuar essa recuperação dos mananciais. A gente tem um alívio, mas ainda é cedo para dizer que estamos efetivamente caminhando para uma solução ou para o término dessa crise”, avaliou Côrtes.

A Sabesp estima que a recuperação da reserva técnica ocorra até abril.

Para Venturi, o tempo de recuperação das represas não tem relação com a natureza, mas sim com “a gestão e a velocidade com que se retira água deste corpo hídrico”.

Ele aponta que as represas secam não pela falta de chuvas, mas porque o ritmo de retirada é superior ao de reposição.

“Como culpar o clima pelo esvaziamento de algumas represas se as outras estão cheias e todas elas estão sob o mesmo clima?”, questiona.

Ele usa como exemplo para demonstrar a falta de planejamento na gestão dos recursos hídricos o fato de que a região Amazônica registra os menores índices de acesso à água potável no Brasil, mesmo sendo o local onde há mais água doce no mundo.

Acompanhe tudo sobre:Águacidades-brasileirasMetrópoles globaissao-paulo

Mais de Brasil

Lira afirma que 'tudo que foi feito em cumprimento' à decisão do STF sobre emendas

Barroso afrouxa regra para câmeras da PM em SP, mas exige uso obrigatório em comunidades

Trens e metrô terão tarifa mais alta a partir de janeiro; saiba quando e valores

PM afasta policial que atirou à queima-roupa em rapaz em São Paulo