Brasil

Anvisa quer ir à Justiça contra venda da "pílula do câncer"

Em um comunicado duro, a Anvisa alertou que a liberação do produto coloca em risco a saúde da população e abre perigoso precedente


	"Pílula do câncer": Anvisa considera que liberação antes de testes abre precedente perigoso e coloca em risco saúde da população.
 (Pawel Kryj / Stock Xchng)

"Pílula do câncer": Anvisa considera que liberação antes de testes abre precedente perigoso e coloca em risco saúde da população. (Pawel Kryj / Stock Xchng)

DR

Da Redação

Publicado em 15 de abril de 2016 às 07h58.

Brasília - A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estuda ingressar com uma ação na Justiça para anular os efeitos da lei sancionada na quinta-feira, 14, pela presidente Dilma Rousseff que libera o uso da fosfoetanolamina sintética - a chamada "pílula do câncer" - mesmo sem pesquisas que comprovem a segurança e a eficácia do composto.

Em um comunicado duro, a Anvisa alertou que a liberação do produto coloca em risco a saúde da população e abre perigoso precedente.

À reportagem, o presidente da agência, Jarbas Barbosa, afirmou nesta semana que a aprovação faria o País regredir para um período anterior à década de 1970, quando ainda não havia regras de fiscalização na área de saúde.

Aprovada às pressas no Congresso, a lei autoriza o uso da substância por pessoas com câncer, desde que apresentem laudo médico que comprove o diagnóstico e um termo de consentimento do paciente ou de seu representante legal.

Entidades como o Conselho Federal de Medicina (CFM) continuam a não recomendar a substância sem pesquisas mais aprofundadas. Para outros especialistas, provavelmente a discussão vai parar no Supremo Tribunal Federal (STF) - que já teve de responder a liminares de pacientes, que cobravam da Universidade de São Paulo (USP), única a sintetizar a substância, a entrega do produto.

Hoje, a USP está obrigada a fornecer as pílulas somente até o fim de seu estoque em São Carlos, no interior.

Para as famílias dos doentes, porém, a liberação foi motivo de comemoração. "A gente torcia muito para que isso acontecesse. Foi uma vitória dos pacientes, que lutaram para ter o direito de usar uma substância que fez bem para tanta gente", disse a advogada Marisa Benelli, de 48 anos, filha do aposentado Marionaldo Benelli, de 69, que toma a fosfoetanolamina desde 2013, meses depois de ser diagnosticado com câncer na próstata e nos ossos.

"Ele fez o tratamento tradicional enquanto tomava a 'fosfo' e a doença diminuiu. Os médicos tinham dado seis meses de vida para ele", conta.

A controladora de quadro Eloá Karolins, de 22 anos, também comemorou a decisão. Sua mãe foi diagnosticada com a doença há três anos.

"Teve câncer no rim, iniciou o tratamento com radioterapia e a doença veio mais forte, atingindo outros órgãos. Está fazendo quimioterapia, mas o tratamento é agressivo."

Pelas redes sociais, Eloá fez contato com grupos que usam a fosfoetanolamina, mas descobriu que a fabricação estava proibida. "Agora, espero conseguir."

Polêmica

A lei sancionada terá validade até que testes sobre a segurança e a eficácia do composto sejam concluídos. A fosfoetanolamina sintética começou a ser usada por pacientes com câncer há 20 anos, depois que um laboratório do Instituto de Química de São Carlos, da USP, passou a produzi-la.

Tal prática se estendeu até 2014, quando a universidade proibiu que produtos experimentais fossem entregues à população. Pacientes reagiram e o assunto foi parar na Justiça.

Diante da polêmica, os Ministérios da Saúde e da Ciência, Tecnologia e Inovação decidiram custear estudos para avaliar a segurança e a eficácia do composto.

Resultados preliminares indicaram baixo potencial das cápsulas contra os tumores. Enquanto isso, um grupo de deputados apresentou um projeto de lei para apressar o processo.

Esta é a primeira vez que um produto indicado para tratamento de uma doença é aprovado sem estudos de eficácia e segurança.

"A sanção da presidente é uma resposta à comoção da sociedade. Não acho que tenha sido precoce, não foi precipitado", afirmou a ministra interina da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Emília Curi. Nos bastidores, o MCTI, ao lado dos Ministérios da Saúde e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, além de Anvisa e Advocacia-Geral da União (AGU), opinou pelo veto total à proposta.

A presidente, no entanto, ignorou tais pareceres.

Regulação

A lei permite tanto a produção quanto a manufatura, distribuição e dispensação do produto. Para o Ministério da Saúde, essas atividades ainda precisarão de regulação - que não se sabe quando e como será feita.

A pasta sugere que o médico use talonário numerado - recurso que pode permitir o rastreamento do paciente.

O ministério indica que estabelecimentos fornecedores do composto façam um balanço da movimentação da substância. Segundo o governo, por enquanto, o produto não terá custos cobertos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). (Colaboraram Fabiana Cambricoli e José Maria Tomazela)

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Acompanhe tudo sobre:AnvisaCâncerDoençasSaúdeSaúde no Brasil

Mais de Brasil

Presidente Lula discute sobre Enel com primeira-ministra italiana

Gás mais barato? Brasil deve assinar acordo com Argentina para ampliar importação, diz Silveira

Eduardo Suplicy diz que está em remissão de câncer após quatro meses de tratamento

Presidente turco viaja ao Brasil com intenção de defender a Palestina no G20