Área desmatada na Amazônia: crime organizado atua no garimpo e extração de madeira (Bruno Kelly/Reuters)
Carla Aranha
Publicado em 27 de abril de 2021 às 11h51.
Última atualização em 27 de abril de 2021 às 14h11.
Professor de pós-gradução em geografia na Universidade do Estado do Pará, Aiala Colares Couto pesquisa há 12 anos a relação entre geopolítica, criminalidade e meio ambiente na Amazônia. Autor de diversos estudos sobre o tema, Couto prepara agora uma ampla pesquisa, em conjunto com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, sobre a relação entre o crime organizado e a degradação ambiental na Amazônia. “Ambos estão relacionados”, diz. “Os grupos criminosos que atuam na região e a transformam numa zona de conflito também desmatam a floresta através do garimpo e a extração ilegal de madeira”. Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista.
A partir de quando a região amazônica se tornou um grande corredor de entorpecentes, como você cita no estudo “Ameaça e caráter transnacional do narcortráfico na Amazônia brasileira”?
Desde o início deste século. As facções criminosas no Brasil começaram a formar alianças com grupos em países que fazem fronteira com a Amazônia, como a Colômbia e o Peru. Amazônia brasileira se tornou uma rota primária dos fluxos de cocaína que se direcionam para a Europa e África através de rede formadas a partir da conexão do Brasil com a Guiana Francesa, Suriname e países andinos. O crime organizado aproveita os rios da região e a imensidão da Amazônia, que representa um desafio para a fiscalização, para produzir e traficar substâncias ilícitas.
Por isso você diz que a Amazônia se tornou um dos lugares mais perigosos do mundo?
Sim. A população fica sob constante ameaça das organizações criminosas. Esses grupos aliciam indígenas, quilombolas e os moradores da região em geral. Também há conflitos armados pelo controle das rotas, além de assassinatos. É preciso lembrar ainda que esse cenário representa uma instabilidade geopolítica perigosa nas fronteiras do Brasil com os outros países da região amazônica.
Há uma relação clara entre o crime organizado e o desmatamento?
Sim, estão relacionados, como vamos demonstrar no estudo que está sendo preparado com o Fórum Brasileiro de Segurança. No Pará, por exemplo, o minério ilegal segue para a Europa junto com as drogas. As facções criminosas praticam o garimpo ilegal, o corte de árvores para obtenção de madeira e a biopirataria, entre outros ilícitos. As mesmas rotas na floresta são usadas para transportar madeira ilegal, minérios e drogas, que seguem para o mercado europeu e africano. No caso de entorpecentes, parte fica no mercado interno.
E como você avalia a ação do Estado para coibir as atividades ilegais na região?
A dimensão territorial da Amazônia apresenta um desafio para a fiscalização por parte do poder público, que conta com um número limitado de agentes. Precisa haver uma estratégia de segurança e defesa.
Que tipo de estratégia?
O ideal é um plano baseado em dois pilares, um de cooperação estratégica com os outros países da região amazônica e outro doméstico, com uma presença firme do Estado na região. É necessário também diminuir a desigualdade e a pobreza na Amazônia, que tornam a população local mais vulnerável ao aliciamento das facções criminosas. Além disso, precisaria haver um aumento do efetivo do exército.
Você vê algum avanço nesse sentido?
Não.
A Amazônia se tornou uma zona de conflito?
Sim. A região conta com importantes recursos naturais e se tornou alvo da ganância. Hoje, temos um cenário de controle de território por organizações armadas, homicídios, ameaças, grupos indígenas contra e a favor da mineração. É um clima de tensão permanente.