Policiais da UPP em comunidade carioca: relatório policial concluiu que a tortura de moradores era costumeira nos contêineres da sede da UPP (Tânia Rêgo/ABr)
Da Redação
Publicado em 3 de outubro de 2013 às 09h45.
Rio - Além dos crimes de tortura seguida de morte e de ocultação de cadáver, os dez policiais militares da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha acusados de envolvimento no sumiço do pedreiro Amarildo de Souza serão denunciados pelo Ministério Público por fraude processual, acusados de tentarem confundir a investigação.
Segundo o relatório da Polícia Civil, que pede a prisão preventiva dos dez PMs indiciados, a tortura de moradores era costumeira nos contêineres da sede da UPP, no topo da favela.
A mulher de Amarildo, Elisabete Gomes da Silva, comemorou a conclusão policial. "Todos na comunidade sabiam que meu marido sumiu na mão dos PMs. Amarildo foi nascido e criado na Rocinha, era muito querido, não tinha motivo para ser morto pelos traficantes. Essa história foi inventada numa tentativa de inocentar os PMs. Agora que a verdade veio à tona, só me resta lutar para que eles sejam condenados e torcer para que o corpo apareça. Ele merece ter um enterro digno."
Entre os PMs que vão responder pelos três crimes há dois oficiais: um tenente e o major Edson Santos, que comandava a UPP quando ocorreu o sumiço, em 14 de julho. Se condenados, as penas individuais podem chegar a 30 anos. Todos negam as acusações. Eles afirmam que Amarildo foi ouvido e liberado em seguida.
O advogado Marcos Espínola, que defende quatro dos dez PMs, afirmou que as provas contra os acusados são frágeis. "A polícia quis dar uma satisfação à opinião pública. Tenho certeza de que a fragilidade das provas resultará na absolvição dos policiais pela Justiça."
O inquérito, presidido por Rivaldo Barbosa, titular da Divisão de Homicídios, tem 2 mil páginas e o relatório final, 180. Além dos depoimentos de 50 testemunhas, escutas telefônicas foram usadas. "A denúncia deve ser distribuída no máximo até sexta (amanhã) pelos crimes de tortura seguida de morte, ocultação de cadáver e fraude processual", disse o promotor Homero das Neves Freitas Filho. Ele avalia a conduta de cada um dos acusados, mas deve concordar com os pedidos de prisão.
Amarildo desapareceu depois de ter sido levado à sede da UPP supostamente para averiguação. Segundo o relatório, a PM deteve o pedreiro em busca de informações sobre traficantes. Os PMs teriam torturado Amarildo para tentar obter informações sobre um paiol de armas do tráfico.
O relatório sustenta que Amarildo não era associado ao tráfico, mas tinha conhecimento do que acontecia por morar ao lado de uma boca de fumo e atuar como churrasqueiro de traficantes. No início da investigação, o delegado Ruchester Marreiros, então adjunto da 15.ª DP, tentou associar Amarildo à quadrilha e relatou que ele teria sido morto por traficantes.
Tortura
"Não existe prova direta da tortura do Amarildo. Há provas indiciárias e depoimentos de testemunhas que dizem que era hábito a prática de tortura na UPP, com choque, saco na cabeça, pancadaria. Supõe-se que ele tenha morrido no parque onde fica a sede da UPP, em resultado de tortura, mas as circunstâncias exatas não vamos saber, a não ser que um deles (PMs) resolva falar.
Com certeza, segundo o relatório, todos (os dez PMs) concorreram para o resultado final", disse o promotor. "Todos cometeram o mesmo crime. Até porque, se o major deu alguma ordem, ordem ilegal não se cumpre."
A saída de Amarildo não foi registrada pelas câmeras de segurança da unidade - a câmera da sede não estava funcionando. A polícia analisou as imagens de 80 câmeras. Ontem, o delegado disse que "há um conjunto de provas testemunhais e de inteligência que levou à convicção" da participação dos dez PMs. Indagado sobre o conteúdo do relatório, esquivou-se.
"Em respeito ao MP e ao Poder Judiciário, que ainda estão apreciando o inquérito, preferimos não falar", disse. Ele afirmou que não foram encontrados vestígios de sangue dentro da UPP. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.