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Alckmin pisa fundo

Visando a indicação do PSDB para disputar a Presidência da República, governador acelera a entrega de obras de infraestrutura no estado de São Paulo

GERALDO ALCKMIN: governador de São Paulo vai a Pernambuco nesta quarta-feira / Edson Lopes Jr./A2 Fotografia

GERALDO ALCKMIN: governador de São Paulo vai a Pernambuco nesta quarta-feira / Edson Lopes Jr./A2 Fotografia

Raphael Martins

Raphael Martins

Publicado em 18 de fevereiro de 2017 às 07h24.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h43.

Há uma relação de carinho especial entre Geraldo Alckmin (PSDB-SP) e a linha 5-Lilás do Metrô de São Paulo. Em outubro de 2002, as fitas de inauguração do primeiro trecho, entre o Capão Redondo e o Largo Treze, na zona sul da capital, foram cortadas apenas uma semana antes das eleições para o Governo do Estado de São Paulo. O candidato de situação era o próprio Alckmin, que assumira o posto de governador com a morte de Mário Covas e agora buscava a maior vitória de sua carreira política nas urnas. Não que esta tenha sido a causa única ou decisiva na recondução ao Palácio dos Bandeirantes, mas mal também não fez a vistosa obra entregue, avaliada em 1,45 bilhão de reais à época, algo como 3,63 bilhões de reais hoje.

Avançando 5.228 dias no tempo desde aquela inauguração, agora governador em segundo mandato, o tucano anunciou nesta segunda-feira 13 que a mesma linha 5-Lilás ganhará, em plena crise, nada menos que nove estações até o fim de 2017 ao custo de 10 bilhões de reais. Com as novas estações, o novo mapa da linha Lilás baterá 20 quilômetros de extensão e integrará com as linhas 1-Azul, 2-Verde e a futura 17-Ouro do monotrilho — que ainda não saiu.

O anúncio faz parte de um pacote de obras que Alckmin pretende deixar de legado para se capitalizar na disputa pela presidência da República em 2018. Cumpridas as promessas, o tucano tem, ao menos em teoria, argumentos consistentes para unir o partido em torno de seu nome. Na tríade de caciques que almejam o Planalto, sai em vantagem contra José Serra (SP), que se desdobra para mostrar trabalho no Itamaraty, e Aécio Neves (MG), que não conseguiu fazer sucessores em Minas, mas tem papel importante na articulação do governo Michel Temer no Senado.

O exemplo da linha 5-Lilás ilustra o que será o 2017 de Alckmin. Enquanto o país luta para se reerguer da crise, que levou o desemprego a 13% e uma série de estados a sofrer com salários atrasados e manifestações públicas, o governador de São Paulo vende outra realidade. No balanço de 2016, o Governo do Estado anunciou superávit de 1,5 bilhão de reais e 15,3 bilhões de reais em investimentos. A situação financeira do estado de fato é melhor que a média, mesmo com 222 bilhões em dívidas ao Tesouro em novembro, segundo o Banco Central, e corte de 900 milhões de reais no Orçamento de 2017 em relação ao ano anterior.

Mas Alckmin foi citado nas delações da Odebrecht. Sob o codinome “Santo”, é acusado de receber 2 milhões de reais de caixa 2 nas campanhas de 2010 e 2014, entregues ao empresário Adhemar Ribeiro, irmão da primeira-dama, Lu Alckmin, e pelo atual secretário de Planejamento do governo paulista, Marcos Monteiro, homem de confiança do governador.

A escolha do metrô como bandeira é, vamos dizer, controversa. De 2002 para cá, o trecho ganhou apenas uma estação que aumenta o percurso dos originais 8,4 quilômetros para 9,3 quilômetros, a parada Adolfo Pinheiro, entregue em 2014, com quatro anos de atraso por suspeita de fraude em licitação. O esquema foi revelado em outubro de 2010 pelo jornal Folha de S. Paulo, que mostrou que se sabia quem seriam os vencedores da licitação com seis meses de antecedência.

Por causa de denúncias semelhantes, como o cartel do Metrô, em que um grupo de empresas combinava preços superfaturados para fornecimento de trens e equipamentos para Metrô e CPTM, e o enfraquecimento das empreiteiras em tempos recentes de Operação Lava-Jato, as obras da linha 4-Amarela, também andam devagar, quase parando. Nada que seja visto como um problema pelo governo paulista.

“A meta que recebi do governador veio em uma palavra: ‘entrega’. Tudo o que tinha sido iniciado, foi priorizado. Concluímos projetos, pagamos desapropriações, publicamos licitações e rescindimos contratos”, afirma o secretário de Transportes Metropolitanos, Clodoaldo Pelissioni. “Em vez de iniciar a extensão da linha 2-Verde até Guarulhos, um investimento pesado, propusemos transferir recursos para obras mais avançadas, como a linha 5-Lilás. Foi um planejamento para termos equacionadas as obras em curso e um universo claro de entregas”. Procurado pela reportagem, Alckmin não concedeu entrevista.

A média de crescimento das linhas de Metrô desde a primeira viagem em 1972 é de cerca de 2 quilômetros de linha por ano. Na Cidade do México, para ficar num exemplo comparável com São Paulo, o metrô avança três vezes mais rápido. Por lá, o metrô chegou a 225 quilômetros; em São Paulo, 78. Durante o atual mandato de Alckmin, de 2014 a 2016, foram inauguradas somente quatro estações: Fradique Coutinho (Linha 4-Amarela), Adolfo Pinheiro (Linha 5-Lilás), Vila Prudente e Oratório (Linha 15-Prata). No anterior, de 2011 a 2014, foram oito.

“Para acelerar a entrega, tem que haver preocupação real com efetivas garantias ao investidor na fase de licitação e cobrança do estado para cumprimento do contrato. Deu errado? Substitui a empresa o quanto antes”, afirma Creso Peixoto, professor de Engenharia Civil da FEI e mestre em transportes. “A demanda em São Paulo é evidente. Com uma estruturação de tarifas realista, que garanta que o consumidor não vá trocar o transporte público pelo privado, a garantia está dada”.

O caminho das obras

Desde que o Brasil é Brasil inaugurar obras é o melhor caminho para se alçar politicamente. Alckmin acelera também o Rodoanel. O empreendimento de 8,1 bilhões de reais deve ser concluído com as entregas do Trecho Norte, 44 quilômetros de estradas entre Rodovia dos Bandeirantes e a Via Dutra, passando pela Serra da Cantareira. A parcela de ligação deveria estar pronta em 2013, mas agora será entregue em março de 2018. No pacote de inaugurações há ainda o Hospital Estadual de São José dos Campos e o de Sorocaba, ambos feitos por parcerias público-privadas, iniciados em 2015 e previstos para 2018, a interligação entre as represas Jaguari (bacia do Paraíba do Sul) e Atibainha (Sistema Cantareira), entre outros.

É claro que, para ter chances de ser eleito em 2018,  Alckmin terá de ir além das obras. Tucanos ligados aos outros dois caciques reclamam de falta de abertura da cúpula “alckmista” em suas decisões e posicionamentos políticos. Os episódios que culminaram na eleição de João Doria (SP) para a prefeitura de São Paulo passaram um sinal positivo de conhecimento do eleitorado e liderança política no estado, mas também o negativo de ter supostamente usado a máquina do estado para favorecer seu pupilo e dialogado pouco com tucanos ligados a José Serra. O modus operandi levou à saída de Andrea Matarazzo do partido, um tucano tradicional com mais de 25 anos de atuação, e também a uma união entre os grupos de Serra e Aécio. O PSDB é cada vez mais Alckmin contra o resto.

Maior exemplo da formação de um “clubinho” foi a prorrogação do mandato de Aécio como presidente do PSDB, em dezembro passado. À cabeceira da mesa da reunião da Executiva Nacional do partido estavam Paulo Bauer, líder do PSDB no Senado, Antonio Imbassahy, então líder do PSDB na Câmara, Serra e Aécio. Nenhum “alckmista”. O resultado foi obtido, segundo nota do partido, por “ampla maioria” dos presentes, motivados a “manter a unidade do partido, neste momento de crise econômica e política”. Nos bastidores do Congresso, tucanos comentavam que Alckmin ficara contrariado com a decisão. A posição central de Aécio no partido poderia gerar convergência para lançar seu nome às urnas. O governador sabe que uma junção entre as alas “aecista” e “serrista” pode lhe custar a candidatura.

Outro sinal de alerta vem de dentro de casa. Segundo a coluna Painel, do jornal Folha de S. Paulo, auxiliares de Alckmin estão preocupados com o “estilo João Doria”, que através do marketing incansável tem mostrado um novo jeito de fazer política aos tucanos. “Sem dúvida, Doria confirma um estilo diferente de relação com a sociedade que o torna bem interessante para a mídia”, confirma um tucano próximo ao governador. “A questão é que sobrepor qualquer um dos caciques do partido neste momento é um crime de lesa-pátria. Não tem espaço para isso”, diz outro.

“Quando tem muita gente competindo por um só cargo, é preciso ter essa agenda positiva de obras e realizações”, afirma Rafael Cortez, analista político da Tendências Consultoria. “O segundo passo na pré-campanha é mais complicado, que é construir e dialogar com lideranças nacionais, tanto do partido, como do eleitorado”.

Em outras palavras, para que Alckmin se cacife, é hora de sair de São Paulo. A ideia de seus pares paulistas é justamente “nacionalizar” o governador, explorando sua experiência política, a demonstração de responsabilidade fiscal, a fortíssima estrutura partidária que tem por trás e o apoio de nomes fortes para o eleitorado, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Soma-se a enorme capacidade de articulação, demonstrada pela eleição de Doria no ano passado e sua própria reeleição em 2014, ambas em primeiro turno.

Como político tradicional, o grande desafio é combater a crescente insatisfação do eleitor com a classe política. “Mesmo com a chance de surgimento de um outsider, as normas da política fazem esse desafio menor em relação às características que o Alckmin tem. A estrutura político-partidária e eleitoral que temos favorecem as velhas estruturas, como o tempo de televisão, que é proporcional ao Congresso Nacional e coligações. Ele tem um poder enorme nesse sentido”, diz Lucas de Aragão, diretor da consultoria política Arko Advice.

O governador viaja nos próximos dias à cidade de Sertânia, no estado do Pernambuco, para a entrega de quatro bombas d’água cedidas pela Sabesp para acelerar a obra de transposição do Rio São Francisco. Os equipamentos foram usados para deslocamento de água durante a crise hídrica de São Paulo. Há pouco tempo a maior crise de seu mandato como chefe do estado, este é um símbolo de vitória como política pública de gerenciamento da seca. O sistema Cantareira, que chegou a usar duas cotas de reservas profundas de água (apelidado de “volume morto”), hoje opera com mais de 91% do volume útil. O maior mérito para o fim da crise tem que ser dado a São Pedro, e urbanistas dos mais diversos matizes criticaram a falta de planejamento – mas vá lá, a crise passou, e Alckmin, como bom político, vai usar a vitória a seu favor.

Acumulados os sucessos no Metrô e Rodoanel, a narrativa de sua reeleição e a jogada de mestre para retomar a prefeitura de São Paulo para o partido, Alckmin acumula feitos pra lá de suficientes pleitear seu lugar na campanha presidencial. O problema, para ele, é que currículo e obras não bastam numa corrida presidencial, em que identificação com eleitores Brasil afora é decisivo. Que comecem as viagens.

 

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