Estudantes e professores de institutos federais e universidades fazem manifestação na Avenida Presidente Vargas, no Rio, contra o bloqueio de verbas da educação (Fernando Frazão - Agência Brasil/Agência Brasil)
Estadão Conteúdo
Publicado em 28 de maio de 2019 às 16h47.
Brasília — Em manifestação enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF), a Advocacia-Geral da União (AGU) defendeu a realização de operações policiais em universidades, caso seja constatada propaganda eleitoral irregular dentro dos câmpus. Para a AGU, as universidades devem adotar "postura imparcial", "para evitar influência tendenciosa" na disputa do processo eleitoral.
O órgão do governo Jair Bolsonaro (PSL) também defende a tese de que a Lei das Eleições é clara ao proibir qualquer espécie de propaganda eleitoral no interior de prédios e órgãos públicos, inclusive no caso de universidades públicas. Na avaliação da AGU, a universidade deve, sim, ser reconhecida como "um espaço de livre debate de ideias, mas sem a prevalência de corrente de pensamento específica, e que, eventualmente, essa parcialidade possa interferir no processo eleitoral de forma ilegal".
"A legislação eleitoral conferiu concretização adequada aos princípios constitucionais da liberdade de expressão e da autonomia universitária, que devem ser exercidos dentro dos limites necessários à garantia da higidez da disputa eleitoral. Isso significa que as universidades devem adotar postura imparcial, de modo a se evitar influência tendenciosa na disputa do processo eleitoral", escreveu o advogado-geral da União, André Mendonça.
"Permanece autorizada a discussão de ideias no âmbito das universidades, sempre com espaço para posições divergentes, desde que semelhante debate possua pertinência com as atividades acadêmicas e não se converta em autêntica propaganda eleitoral", frisou Mendonça.
A manifestação da AGU foi feita ao Supremo no âmbito de uma ação da Procuradoria-Geral da República (PGR) para assegurar a livre manifestação do pensamento e de ideias em universidades e de reunião de estudantes e de professores nas instituições de ensino. A PGR acionou o Supremo durante a campanha eleitoral do ano passado, após juízes eleitorais proibirem supostas propagandas eleitorais irregulares em universidades pelo País, atingindo ao menos 17 instituições em nove Estados.
Na véspera do segundo turno das eleições, a ministra Cármen Lúcia (relatora da ação) suspendeu liminarmente os atos judiciais e administrativos que determinaram o ingresso de agentes em universidades públicas e privadas pelo País. Na ocasião, Cármen afirmou que "toda forma de autoritarismo é iníqua" e "pior quando parte do Estado". "Pensamento único é para ditadores. Verdade absoluta é para tiranos", assinalou a ministra à época.
A liminar de Cármen acabou sendo confirmada pelo plenário do Supremo por unanimidade em 31 de outubro do ano passado. Naquela sessão, os ministros fizeram discursos enfáticos em defesa da pluralidade de ideias, com duras críticas à repressão da ditadura militar. Também reafirmaram a defesa da liberdade de cátedra, de reunião e de expressão. O Supremo ainda deve julgar o mérito da ação da PGR. Não há previsão de quando o novo julgamento vai ocorrer.
Em manifestação enviada ao STF, a Advocacia-Geral da União (AGU) também defendeu o contingenciamento promovido pelo governo de 30% das verbas discricionárias (não obrigatórias) das universidades e de outras instituições de ensino federais.
O bloqueio foi questionado no Supremo, em diferentes ações, por ao menos cinco partidos que fazem oposição ao governo: PDT, Rede, PSB, PCdoB e PV. Entre outros argumentos, as siglas alegam que o Decreto 9.741, que permitiu o contingenciamento, compromete o direito constitucional à educação e fere o princípio de "vedação ao retrocesso", além de violar a autonomia universitária.
Ao relator dos processos, ministro Celso de Mello, o advogado-geral da União, André Mendonça, afirmou que, ao contrário do alegado pelos partidos, o bloqueio não compromete de imediato os serviços prestados pelas instituições de ensino, pois o dinheiro pode ser liberado no futuro, antes que os recursos já disponíveis se esgotem.
"É importante deixar claro que o percentual bloqueado de 30% é da dotação discricionária das universidades. Ou seja, dos 100% que elas teriam para todo o ano de 2019, 30% foram bloqueados neste momento. Tendo em vista que não há possibilidade de as universidades e os institutos executarem 100% de suas despesas no primeiro semestre do ano, esse bloqueio não afetará de imediato nenhuma política ou pagamento dessas unidades", escreveu o advogado-geral da União.
Sendo assim, "o contingenciamento orçamentário em análise obedece fielmente à legislação de regência e à finalidade pública para a qual está autorizado, sem interferência na autonomia universitária", acrescentou Mendonça.
O AGU argumentou ainda que o direito à educação deve ser ponderado com outros princípios, como o da eficiência na administração pública e da aplicação responsável do dinheiro disponível, "diante do cenário de escassez de recursos públicos ora vivenciado pelo Estado brasileiro".
Mendonça também negou que tenha havido discriminação de instituições específicas. "No presente caso concreto, o 'bloqueio orçamentário' ou a 'contenção de despesa' foi realizada de forma linear, no mesmo percentual, para todas as instituições, o que afasta qualquer alegação de uso com fins persecutórios ou punitivos", escreveu o AGU.
O ministro Celso de Mello adotou rito abreviado para julgar as ações sobre o caso, que deve assim ser levado diretamente a julgamento pelo plenário do Supremo. Ainda não há data prevista para a análise.