Agência de notícias
Publicado em 18 de setembro de 2024 às 18h26.
O governo corre risco de ser derrotado no Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento de ações contra vários pontos da Reforma da Previdência, aprovada em 2019. Entre as mais de 15 ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) em andamento na Corte, quatro temas podem aumentar o rombo do regime de aposentadoria em R$ 206,4 bilhões, segundo cálculos da Advocacia-Geral da União (AGU).
O impacto pode ser ainda maior se considerados os regimes previdenciários dos estados e municípios, que também fizeram reformas com base no texto aprovado para os servidores federais. A Reforma da Previdência entrou em vigor em novembro de 2019 com o propósito de economizar R$ 800 bilhões em dez anos.
As projeções sobre o efeito das decisões do STF foram publicadas pelo jornal O Estado de S. Paulo. Segundo uma nota técnica, à qual O GLOBO teve acesso, o impacto de R$ 206,4 bilhões refere-se a quatro temas, nos quais os julgamentos estão empatados ou já possuem maioria para derrubar trechos da reforma. Até a decisão final, os ministros podem alterar suas posições.
Os julgamentos foram suspensos por pedidos de vista, e ainda não há data para sua retomada.
A ação de maior impacto busca restaurar a contribuição linear de 11% para todos os servidores, independentemente da remuneração. O placar está empatado. Caso a decisão seja favorável, o impacto estimado pela AGU é de R$ 73,8 bilhões.
A reforma introduziu no regime dos servidores públicos (Regime Próprio de Previdência Social - RPPS) a progressividade das alíquotas de contribuição, entre 7,5% e 22%, com o objetivo de convergir com o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), dos trabalhadores do setor privado, cujas alíquotas variavam entre 8% e 11% e subiram para 7,5% a 14%.
Outra ação visa derrubar a possibilidade de a União cobrar uma contribuição extraordinária para sanar o déficit atuarial do regime previdenciário dos servidores, quando os compromissos futuros com aposentadoria são trazidos a valor presente. Essa cobrança extra pode ser aplicada a ativos e inativos com remuneração acima de um salário mínimo. Antes da reforma, a contribuição só podia ser cobrada dos funcionários com rendimentos acima do teto do INSS (hoje em R$ 7.786).
Embora o regime previdenciário do RPPS apresente déficit, a União ainda não implementou essa contribuição extra. Caso o STF rejeite essa medida, o impacto seria de R$ 71,4 bilhões. Atualmente, há maioria para derrubar esse trecho da reforma.
A ampliação da base de cálculo para a contribuição de aposentados e pensionistas também está sendo contestada. A reforma permite que a contribuição incida sobre todos os proventos acima de um salário mínimo, em caso de déficit. Neste caso, já existe maioria de votos no STF para a derrubada da regra, com um impacto estimado em R$ 55,1 bilhões.
Outra ação busca aumentar o valor do benefício para servidoras que perderam a integralidade (última remuneração do cargo) e a paridade (reajuste igual para ativos e inativos). Há maioria no STF para mudar o cálculo da aposentadoria.
Com a reforma, após 20 anos de contribuição, o benefício passou a ser calculado como 60% da média das contribuições, mais 2% por ano adicional. No regime geral, o tempo mínimo é de 15 anos, mas as mulheres enfrentam mais dificuldades em contabilizar tempo devido à falta de estabilidade no emprego.
Segundo o especialista Leonardo Rolim, que atuou na Reforma da Previdência, essas ações no STF representam uma contrarreforma, contrariando um dos princípios da mudança, que era buscar convergência entre os regimes do setor privado e dos servidores públicos.
“É uma pena que isso esteja acontecendo”, afirma Rolim.
Ele alerta que, dependendo das decisões, o rombo da Previdência pode crescer ainda mais, agravado pelas mudanças demográficas, que já indicam a necessidade de uma nova reforma.