Uma das obras apreendidas durante a Operação Lava Jato: entre elas há obras de Salvador Dalí e de artistas contemporâneos (Polícia Federal/Curitiba/Fotos Públicas)
Da Redação
Publicado em 1 de abril de 2015 às 18h41.
Há um toque de intriga unindo os 15 trabalhos de arte que ocupam duas salas do Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, no Brasil: todos foram apreendidos durante o maior escândalo de corrupção da história do país.
E a mostra está prestes a aumentar. O museu recebeu mais de 200 peças apreendidas pela Polícia Federal sob suspeita de terem sido usadas para lavagem de dinheiro.
Entre elas há obras de Salvador Dalí e de artistas contemporâneos brasileiros aclamados mundialmente como Miguel Rio Branco.
Como a Operação Lava Jato, investigação de corrupção que abrange mais de uma década de subornos e corrupção na Petrobras, a petroleira controlada pelo Estado, está centrada em Curitiba, o museu local se tornou um beneficiário.
As autoridades precisavam de uma instituição com espaço e expertise para guardar todas as obras de arte apreendidas. A publicidade da mostra ajudará a ampliar o público do museu, disse Juliana Vosnika, diretora da instituição.
“Quando as pessoas sabem que essas obras são de uma operação como esta, isso já é uma curiosidade", disse ela durante uma entrevista no escritório administrativo do museu.
“Nao é interessante descobrir uma operação como esta, mas nos temos que pensar que isto tem sido positivo pra o próprio museu”.
Projetado pelo arquiteto mais famoso do Brasil, o museu, conhecido como MON, parece um olho gigantesco dependurado sobre uma coluna amarela retangular, com uma rampa característica de Niemeyer serpenteando até a entrada.
Uma mostra está programada para abrir no dia 14 de abril, apresentando cerca de 50 peças recebidas da PF, incluindo pinturas dos artistas brasileiros Emiliano Di Cavalcanti e Iberê Camargo.
Lavagem com arte
Na Operação Lava Jato, chamada assim porque o dinheiro supostamente era desviado por meio de um posto de gasolina, executivos da Petrobras teriam aceito propinas de um cartel de empreiteiras e dividiam os recursos com políticos.
O caso, que envolve pelo menos R$ 4,1 bilhões (US$ 1,3 bilhão) em suposta corrupção e dezenas de prisões, paralisou o Brasil e contribuiu para a queda do índice de aprovação da presidente Dilma Rousseff, que está em 13 por cento e é o mais baixo de um presidente brasileiro nos últimos 15 anos.
Os promotores dizem que o escândalo revelou o uso de obras de arte para a lavagem de dinheiro e o encobrimento da trilha das propinas. No dia 16 de março, a polícia apreendeu 131 peças, incluindo uma litografia do artista catalão Joan Miró, após entrar no apartamento de Renato Duque, ex-chefe de engenharia e serviços da Petrobras.
Duque está em prisão preventiva em Curitiba. Ele negou envolvimento em qualquer irregularidade. Seu advogado, Renato de Moraes, não respondeu a um e-mail e a um telefonema em busca de comentário.
Serviço público
O museu recebeu a coleção de arte de Duque, terceira série de trabalhos apreendidos na Operação Lava Jato. Segundo a lei brasileira, as propriedades podem ser confiscadas pelas autoridades durante as investigações e leiloadas se os suspeitos forem condenados.
Os trabalhos estão sendo avaliados.
"É interessante que a população possa desfrutar em parte ali do que foi desviado", disse o delegado Márcio Anselmo, um dos chefes da investigação, no dia 27 de março em entrevista na sede da Polícia Federal em Curitiba.
Duque avaliou sua coleção de arte em R$ 80.000 em documentos fiscais, mas uma única peça foi comprada por mais de duas vezes esse preço, disse Anselmo.
A PF pediu explicações a cerca de 20 galerias e vendedores de arte sobre transações envolvendo obras de arte, disse Anselmo, exibindo na tela do computador certificados e faturas de algumas das peças.
Em seu telefone celular, ele mostrou uma imagem de um trabalho do neoconstrutivista Amílcar de Castro. A peça, apreendida na casa do empresário Zwi Skornicki, foi avaliada em R$ 3 milhões, disse Anselmo.
Uma porta-voz de Skornicki, que está sendo investigado por suposto envolvimento com o pagamento de propinas, disse em comentários enviados por e-mail, que todos os trabalhos artísticos apreendidos foram adquiridos legalmente e que os impostos exigidos foram pagos.
O valor combinado da coleção não ultrapassa R$ 500.000, o que inclui o valor de mercado de R$ 90.000 da peça de Amílcar de Castro, disse a porta-voz, acrescentando que nega “veementemente” qualquer envolvimento no escândalo da Lava Jato.
“A vantagem de você manter essas obras é que o valor delas é muito difícil de estimar”, disse Anselmo na entrevista. “Você pode declarar uma por R$ 1.000, e ela vale R$ 1 milhão”.