Mulheres protestam contra estupro: o que é necessário, a partir de agora, é esclarecer a extensão do crime (Ueslei Marcelino/Reuters)
Da Redação
Publicado em 1 de junho de 2016 às 21h29.
Uma adolescente de 16 anos. 33 homens.
O caso do estupro coletivo, que chocou o Brasil na semana passada, parece estar longe de ser solucionado.
Nesta semana, após falar longamente com a imprensa, a delegada responsável pelo caso, Cristiana Bento, não deixou margens para dúvidas: houve estupro. O que é necessário, a partir de agora, é esclarecer a extensão do crime.
Nesta semana, as operações parecem estar concentradas na busca dos suspeitos de terem estuprado a jovem. O vídeo que circulou nas redes sociais na semana passada mostra um dos homens tocando as partes íntimas da vítima, que está desacordada, enquanto outros dois assistem a tudo.
Houve mesmo estupro?
Sim. O crime de estupro não é mais uma dúvida, mas sim um fato. De acordo com Cristiana Bento, titular da Delegacia da Criança e Adolescente Vítima (DCAV), é necessário agora determinar a extensão do crime.
O vídeo que circulou nas redes sociais mostra um dos homens tocando as partes íntimas da vítima, que está desacordada, enquanto outros dois assistem a tudo. A delegada explicou que esta prova, por si só, já caracteriza o estupro coletivo. Segundo Bento, os outros homens que aparecem nas imagens são considerados partícipes do crime.
Pela lei 12.015, de 2009, é considerado estupro "constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso".
A jovem já havia sido estuprada antes?
Sim. A adolescente, que hoje tem 16 anos, teve seu primeiro filho aos 13. Manter relações sexuais com uma menina de 13 anos é estupro, mesmo que a relação seja consentida. De acordo com a lei, a pouca idade é um critério objetivo "para se verificar a ausência de condições de anuir com o ato sexual". Dessa forma, todo o ato sexual envolvendo pessoas com menos de 14 anos configura estupro de vulnerável.
O estupro foi mesmo coletivo?
Sim. Não restam dúvidas de que o crime foi praticado coletivamente. No vídeo onde a jovem aparece desacordada, mais de um homem aparece praticando o crime. Não se sabe, no entanto, quantos exatamente estupraram a adolescente. Em entrevista ao SBT Brasil, a menina afirmou: "Quando eu acordei a luz estava acesa e um montão de gente em cima. Tipo assim, 33 homens. Eu contei".
Um dos suspeitos do crime, Raí de Souza, refutou a versão da menina, e disse que "nem cabem 33 naquela casa". Ele se refere ao abatedouro, imóvel usado para sexo, onde ocorreu o estupro.
Nesta quarta-feira (1º), a Polícia Civil do Rio disse que vai realizar uma perícia no colchão que estava na cama do local. O número exato de abusadores, no entanto, pode não ser descoberto mesmo com o fim das investigações.
O laudo pericial comprovou o crime?
Não. O laudo da perícia sobre o caso diz que a demora em fazer o exame foi determinante para que não fossem encontrados indícios de violência. A adolescente foi examinada quatro dias após o crime. Isso, no entanto, não invalida provas importantes como o vídeo e o depoimento da vítima.
"Nos crimes sexuais, o exame de corpo de delito é importante, mas não determinante para o fato. No caso dessa menina, se ela estava descordada, não vai ter lesão porque ela não ofereceu resistência", explicou Bento.
Quantos suspeitos já foram presos?
Até esta quarta-feira (1º), três suspeitos já foram presos: Raphael Duarte Belo, que aparece no vídeo fazendo uma foto ao lado da jovem, que estava desacordada, Raí de Souza e Lucas Perdomo, apontado como namorado da vítima. Outros três suspeitos de cometerem o crime estão foragidos.
O advogado de Lucas sustenta que o jogador, naquela noite, teve relações com outra garota e que o amigo Raí de Souza ficou com a jovem que diz ter sido estuprada. A menina conta que foi ao morro encontrar Lucas, com quem teria ficado.
Em uma carta enviada para o Jacarepaguá Notícias, página do Facebook, Belo se defende, e conta que tentou ajudar a jovem. Ele afirma que as imagens foram "uma zoação", mas nega ter mantido relações sexuais com a vítima.
Já Souza, representado pelo advogado Alexandre Santana, disse que a vítima estava "superconsciente" no momento do abuso. Santana reafirmou que Raí teve relações sexuais com a jovem de maneira "consensual", horas antes da gravação da filmagem divulgada nas redes sociais.
É importante lembrar que, mesmo com as versões conflitantes dos suspeitos do crime, o estupro está provado por meio do vídeo, que circulou nas redes sociais após ser postado no Twitter, na semana passada.
Também são procurados Sérgio Luiz da Silva Júnior, conhecido como Da Russa (apontado como chefe do tráfico do Morro da Barão, na Praça Seca, onde ocorreu o crime); Marcelo Miranda da Cruz Correa e Michel Brasil da Silva.
Houve omissão do Estado no caso?
Pode-se dizer que sim. Segundo uma reportagem publicada pelo jornal fluminense Extra, o Estado estava ciente da situação de vulnerabilidade da adolescente desde 2013.
Na época, um relato enviado ao Disque Denúncia afirmava que a menina não estudava, não conseguia cuidar do bebê que acabara de dar à luz, agredia seus pais e em “bailes se relacionava com homens desconhecidos, se expondo a riscos”.
Ela chegou a ser internada em uma instituição para jovens usuários de drogas, em 2014. "Foram apenas dois dias com ela, mas muito marcantes", contou uma funcionária ao jornal.
Há envolvimento do tráfico no caso?
De acordo com a delegada que cuida do caso, sim. Em entrevista coletiva, ela afirmou: "Traficante estupra sim. E as meninas não falam, não revelam por medo do traficante. Isso para mim é balela", disse ela, sobre a tese de que os traficantes não admitiriam que tal caso acontecesse na comunidade.
"Eles entram nas residências, pegam as meninas e estupram", afirmou Bento. "Ele não admite que o outro faça, mas ele faz", finalizou, afirmando ainda que muitas meninas não denunciam os crimes por medo dos traficantes.
Na terça-feira (31), o secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, Paulo Melo contou ao Extra que a menina recebeu ameaças de morte, tanto de traficantes do Morro do Barão, onde ocorreu o abuso, quanto de pessoas que vivem em outros estados.
No começo da semana, a adolescente e sua família foram incluídos no Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM). Eles devem mudar para outro estado e não está descartada a possibilidade que a menina ganhe uma nova identidade.
Em entrevista ao Fantástico, ela disse que deseja apenas recomeçar a vida.