EXAME Agro

Apoio:

LOGO TIM 500X313

O que o setor de máquinas agrícolas espera da nova política industrial do governo

Plano Nova Indústria prioriza a mecanização para a agricultura familiar e o Nordeste passa a ser ponto focal das empresas do segmento

 (Nacho Doce/Reuters)

(Nacho Doce/Reuters)

Mariana Grilli
Mariana Grilli

Repórter de Agro

Publicado em 5 de fevereiro de 2024 às 16h35.

Última atualização em 4 de novembro de 2024 às 14h59.

A nova política industrial proposta em janeiro pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI) e liderada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) aqueceu os bastidores do segmento de máquinas agrícolas, após a pasta projetar investimentos de R$ 20 bilhões para a mecanização da agricultura familiar. O momento agora é entender como garantir demanda às montadoras, qual a capacidade fabril no mercado interno e as condições de financiamento de novas máquinas para agricultores de pequeno porte.

Dentre as metas traçadas do programa Nova Indústria, o governo almeja que 70% dos estabelecimentos de agricultura familiar estejam mecanizados até 2033, cujo maquinário deve ser 95% de origem nacional. Os números ambiciosos são possíveis, de acordo com Pedro Estevão, presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas (CSMIA), atrelada à Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).

“Houve consulta do governo com diferentes players do setor para chegar a estes 95% em dez anos. Para produzir uma máquina, você tem de ter um volume razoável, por isso estamos dispostos a entender essa demanda junto ao governo”, ele afirma à EXAME.

Estevão revela que está em contato constante com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e prestes a assinar com o governo um termo de cooperação técnica para pensar conjuntamente como mecanizar a agricultura familiar – que, muitas vezes, carece de máquinas diferentes daquelas já disponíveis no mercado, como menor porte e adaptação a diferentes cultivos.

Quando o apetite pelas novas máquinas estiver oficializado, o objetivo é que o setor esteja pronto para começar a fabricação. “Em linhas gerais, estamos contentes e ajudando o governo a criar isso, porque o programa Nova Indústria tem muito o quê, mas não tem o como. Daqui a 90 dias terão medidas mais específicas”, diz.

Leia também: Addiante: joint venture entre Randoncorp e Gerdau quer dobrar frotas de locação no agro

Alexandre Bernardes, diretor de Relações Institucionais da CNH Industrial, diz que a companhia também foi procurada pelo governo federal no momento da elaboração do plano Nova Indústria, em meio a outros segmentos, como o automotivo, máquinas agrícolas e construção.

“Meu sentimento é que, evidentemente, você precisa de regulamentos. [...] A orientação do vice-presidente [Geraldo] Alckmin é para fazer rodar o plano. O ministro Paulo Texeira também quer correr com isso, e turbinar o programa Mais Alimentos de maneira bastante forte. Nós nos colocamos à disposição do ministério para auxiliar nisso, inclusive no desenvolvimento de produtos”, afirma Bernardes.

Competitividade nacional

De acordo com a CSMIA, o Brasil conta com 450 fabricantes dedicadas ao setor de máquinas e equipamentos agrícolas, incluindo companhias internacionais. Mesmo com a relevância das multinacionais no país, Pedro Estevão esclarece que a competitividade brasileira é atraente e a geração de emprego nacional deve prevalecer.

“Em tecnologia, a gente não deve nada para players de Estados Unidos e Europa, além de serem máquinas adaptadas para nossa agricultura tropical. Como é um mercado crescente, você atrai investimento de fora e nacional, mas não faz sentido ter dinheiro subsidiado para criar emprego fora do país, então é preciso garantir renda e trabalho internamente”, diz o presidente da CSMIA.

De origem italiana, a companhia CNH Industrial faz parte das fabricantes atuantes no Brasil e que há tempos miram a ampliação das máquinas adaptadas à agricultura tropical, diferente da agricultura temperada encontrada no Hemisfério Norte. No entanto, nos últimos anos, faltava espaço para discutir inovação e capacitação do setor, segundo Alexandre Bernardes.

“Houve um declínio muito grande da indústria no PIB brasileiro e a volta do MDIC retoma a possibilidade de conversar sobre estas questões fundamentais. A gente não briga com nossos concorrentes internos, mas com países onde o custo de produção é extremamente competitivo”, afirma o diretor.

Para que haja harmonia entre indústria e produtor, Bernardes defende a necessidade de juros mais baixos, incentivos e segurança fiscal, tanto para o agricultor quanto para a indústria se sentir encorajada a desenvolver maquinários e ferramentas de menor porte com foco na agricultura familiar.

“Esperamos que seja um programa que induza essas ferramentas, e a indústria como um todo possa desenvolver estes novos produtos, isso traz desenvolvimento para o país. Para isso, vamos precisar de linhas de financiamento e algum tipo de incentivo aqui no país, como a possibilidade de exportação”, diz Alexandre Bernardes.

As fontes ainda citam a relação entre o plano da nova agroindústria e a conectividade no campo. Um dos caminhos é a utilização do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust/Lei nº 9.998). Para 2024, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) deve avançar na discussão sobre expandir a conectividade em áreas com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), tendo como prioridades as zonas rurais e escolas. O Plano de Aplicação de Recursos (PAR) do Fust, gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), reserva R$ 2,74 bilhões para o triênio 2023-2025.

Foco no Nordeste

O diagnóstico feito pela câmara setorial mostra que grande parte dos esforços de mecanização será dedicada à Região Nordeste. Segundo Pedro Estevão, 3 milhões de propriedades rurais estão cadastradas no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Destas, somente 17 mil têm condições de investir em mecanização.

“Ainda existem milhares de pessoas que estão trabalhando como subsistência, estando fora do mercado por conta da ausência de mecanização. Imagina acrescentar um terço disso [dos 3 milhões] no mercado... seria sensacional para a agricultura nacional, para o agricultor do Nordeste e para a economia em geral”, diz Pedro Estevão.

Alexandre Bernardes, da CNH, diz que a companhia esteve em conversas com o vice-presidente Geraldo Alckmin e o Ministério do Desenvolvimento Agrário justamente para dar apoio à agricultura familiar do Nordeste. “O agricultor, dando esse passo de sair da subsistência para a comercialização do produto, tem condições de mover a economia e melhorar sua condição de vida”, afirma.

Leia também: Inteligência artificial e autonomia: a revolução das máquinas agrícolas

Quando o assunto é trator e implemento, nisso está subentendido a agregação de tecnologia e, consequentemente, a capacidade de operacionalizar as máquinas modernas. Para citar um exemplo, o diretor da CNH Industrial diz que há maquinários fazendo 1,8 mil ajustes por dia de forma autônoma. “Mas quem faz a manutenção desta máquina? Um programa com foco na qualificação do pequeno agricultor é importantíssimo, incluindo o papel do MDA, a indústria e o Sistema S, com o Senar”, diz.

Bernardes também cita a atenção que o setor tem dado para novas profissões, como operadores de drone e engenheiros de machine learning. “O link entre poder público, academia, escolas e indústria para que haja o desenvolvimento profissional para atender a demanda da indústria e agricultura é uma condição sine qua non”, afirma.

Acompanhe tudo sobre:Máquinas agrícolasAgriculturaMinistério do Desenvolvimento AgrárioGeraldo AlckminIndústriaPolítica industrial

Mais de EXAME Agro

Aumento de custos, menos crédito e mais exportação: como o dólar alto afeta o agro brasileiro

Lei antidesmatamento da União Europeia avança para o Conselho Europeu

Cacau beira os US$ 12 mil e expectativa é de mais volatilidade em 2025

Os planos da maior marca de azeite da Itália para cair — de vez — no gosto do brasileiro em 2025