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Não existe uma solução de curto prazo para baixar preço dos alimentos, diz Marcos Jank

"O grande desafio estrutural, no entanto, continua sendo o câmbio e os juros altos, que impactam diretamente os custos e precisam ser tratados para trazer estabilidade ao mercado", afirma o professor do Insper Agro à EXAME

César H. S. Rezende
César H. S. Rezende

Repórter de agro e macroeconomia

Publicado em 25 de janeiro de 2025 às 06h02.

O governo anunciou que estuda a redução de alíquotas de importação para diminuir os preços dos alimentos, mas, para Marcos Jank, professor do Insper Agro, a medida tem eficácia limitada no curto prazo. Em entrevista à EXAME, Jank destacou que o processo de importação é demorado e envolve altos custos de internalização, o que dificulta um impacto imediato nos preços.

“Normalmente, o Brasil tem preços mais competitivos do que o mercado internacional. No caso da carne, importar um produto mais caro não faz sentido econômico”, afirma o professor.

Na avaliação de Jank, o governo acerta ao direcionar a discussão sobre os preços dos alimentos para os ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário, mas ressalta que não há uma solução mágica. Ele defende que o governo precisa fazer a lição de casa, incluindo o ajuste fiscal, para lidar com os problemas estruturais da economia.

O professor também aponta que a projeção de uma safra 2024/25 recorde no Brasil pode ser a solução que o governo espera para equilibrar os preços, mas ressalta que ainda é necessário aguardar os resultados que virão do campo.

O governo sinalizou que uma das propostas para reduzir os preços dos alimentos pode ser a diminuição da alíquota de importação. Até que ponto essa medida é eficaz para resolver o problema?

O processo de importação é demorado e não resolve problemas de oferta no curto prazo. Além disso, muitos produtos com alta de preços, como a carne, não enfrentam apenas uma questão do mercado interno, mas sim do mercado global, que também está aquecido. Normalmente, os produtos brasileiros têm preços mais baixos do que os internacionais, o que dificulta a viabilidade da importação.

Como no caso da carne?

Exatamente. O Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo porque o preço da carne aqui é mais competitivo. Importar carne a um custo mais alto simplesmente não faz sentido, já que o produto brasileiro tem vantagem de preço. Além disso, o processo de importação envolve custos elevados e um longo tempo para internalizar os produtos, o que limita qualquer impacto significativo no curto prazo.

O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, afirmou que o milho é um dos alimentos que pode ter sua alíquota de importação reduzida. Qual seria o efeito prático dessa medida?

Na minha longa experiência no setor agro, nunca vi medidas emergenciais, como as propostas hoje, funcionarem de maneira eficaz. Essas ações têm algum potencial quando são planejadas e aplicadas no longo prazo, com previsibilidade. Porém, a solução para o problema atual já está a caminho: o milho da segunda safra está sendo plantado e deve ser colhido em breve, o que deve ajudar a regularizar a oferta. O grande desafio estrutural, no entanto, continua sendo o câmbio e os juros altos, que impactam diretamente os custos e precisam ser tratados para trazer estabilidade ao mercado.

Mas o governo parece estar com pressa...

O problema do câmbio e dos juros altos é de natureza estrutural, e, para enfrentá-lo, o governo precisa implementar as reformas necessárias e fazer a lição de casa. A expectativa de que a Selic chegue a 15% reflete a falta de confiança do mercado na capacidade do governo de realizar um ajuste fiscal sólido. Embora a redução de alíquotas de importação possa ser discutida, o processo de buscar fornecedores, garantir volume, negociar preços competitivos e trazer os produtos para o Brasil é lento e demorado, o que dificulta uma solução imediata para o problema.

Esse tipo de medida já foi aplicada alguma vez?

Temos exemplos do passado que mostram que esse tipo de solução não é eficaz. O governo já tentou manter estoques reguladores, mas esses estoques frequentemente se deterioravam, e os processos eram marcados por ineficiências e corrupção. Por isso, essas práticas foram abandonadas, pois se mostraram problemáticas e pouco eficientes.

E o que resolveria nesse caso?

O que realmente faz diferença são dois fatores principais. Primeiro, é necessário ter uma boa safra agrícola. Parte da alta de preços foi causada pelos problemas enfrentados na última safra, principalmente na produção de grãos. Felizmente, a safra atual [2024/25] apresenta projeções otimistas e deve ajudar a reverter essa situação. Segundo, o câmbio e os juros altos são questões fundamentais. A desvalorização do real frente ao dólar eleva o custo em reais de muitos produtos, já que muitos têm seus preços definidos em dólar. Esse efeito, somado às altas taxas de juros, desestimula a produção e acaba pressionando ainda mais os preços.

O governo tem endereçado essa questão dos preços dos alimentos nas pastas voltadas para o setor agrícola...

Sim, a responsabilidade de lidar com essas questões por meio de políticas públicas recai sobre os ministérios diretamente ligados ao setor, como o Ministério da Agricultura e o Desenvolvimento Agrário. O grande erro seria acreditar que a solução está exclusivamente na Fazenda ou na Casa Civil. Entretanto, é importante destacar que não existe uma solução de curto prazo para esse cenário.

Com a agenda fiscal do governo estagnada e a tentativa de implementar medidas artificiais de curto prazo, qual você acredita que será o impacto final nos preços?

Medidas como a redução de tarifas podem até ter algum impacto nos preços da próxima safra, mas não trarão uma queda significativa na inflação dos alimentos no curto prazo. Além disso, o Brasil não é um grande importador; pelo contrário, somos um país exportador, com um saldo comercial positivo.Se o câmbio estivesse mais baixo, talvez mais produtos permanecessem no mercado interno. Porém, não é possível controlar artificialmente a taxa de câmbio de forma sustentável. Por isso, o governo precisa concentrar esforços em fatores estruturais para garantir uma solução de longo prazo.

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