EXAME Agro

Apoio:

LOGO TIM 500X313

A adesão a compromissos socioambientais avança na pecuária brasileira

OPINIÃO | Novos contextos e exigências de consumidores globais são oportunidade para o setor alavancar a sustentabilidade da cadeia produtiva

Pecuária de pequeno porte à beira do Rio Amazonas (Leandro Fonseca/Exame)

Pecuária de pequeno porte à beira do Rio Amazonas (Leandro Fonseca/Exame)

Marina Piatto
Marina Piatto

diretora executiva do Imaflora

Publicado em 21 de julho de 2023 às 14h14.

Líder mundial na exportação de carne bovina, o Brasil conta com um rebanho de mais de 224 milhões de cabeças de gado. Apesar do papel de destaque no mercado internacional, a imagem da agropecuária brasileira sempre esteve bastante associada ao desmatamento, principalmente na Amazônia. O custo reputacional saiu caro para o setor, que dá sinais de que há uma inflexão a caminho.

Os primeiros sinais desse movimento surgiram a partir de 2009 quando empresas frigoríficas que trabalhavam na Amazônia foram levadas a compreender que precisavam se adequar a padrões sustentáveis de produção. Ao aderir a compromissos públicos, termos de ajustes de conduta, protocolos de combate ao desmatamento e pelo fim da ilegalidade na cadeia da carne bovina, parte do setor começou a girar em outro ciclo, mais antenado às exigências do mercado internacional.

As empresas que seguiram a linha da adequação e mudaram seus parâmetros internos de compras de gado estão conseguindo exportar sem restrições. O que está se estabelecendo é uma agenda de autorregulação para demonstrar atendimento às exigências que estão por vir. O alerta é que algumas das demandas externas podem aterrissar fora da realidade e direcionar apenas a segregação de produtos não conformes sem haver impacto na cadeia e no desmatamento.

Jogam a favor do segmento diversas tecnologias de monitoramento e controle, além das auditorias – que precisam se tornar rotina para assegurar que a produção siga em conformidade. As políticas públicas também vão se organizando na perspectiva das novas práticas.

Além das fronteiras amazônicas

De olho no reposicionamento do setor no mercado internacional, a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC) deu um passo assertivo e visionário no sentido de internalizar práticas responsáveis junto aos seus associados. Há poucas semanas, a ABIEC aderiu ao Boi na Linha, desenvolvido pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) em parceria com o Ministério Público Federal (MPF).

O programa foi pensado para ajudar o setor a atingir a conformidade socioambiental, verificar a origem do gado abatido e reduzir o risco de compras ilegais. A ABIEC quer ver a bordo da iniciativa todos os frigoríficos brasileiros – inclusive os fornecedores indiretos.

A adesão eleva de 16 para 39 empresas que irão atender ao protocolo do Boi na Linha, incluindo as três maiores indústrias de carne do país: JBS, Minerva e Marfrig. Juntos, os associados representam 84% dos abates com inspeção federal na Amazônia Legal, 80% dos abates de SIF no Brasil e 98% das exportações brasileiras.

Se na Amazônia Legal, já contávamos com 12 das 16 empresas frigoríficas instaladas na região e que aderiram ao programa Boi na Linha, ganhamos ainda mais escala com a adesão da ABIEC. E mais: o programa passará a incluir também empresas situadas nos demais biomas brasileiros, em especial o Cerrado, onde operam 21 empresas ligadas à associação.

Fato é que as empresas do setor já não podem mais hesitar em relação às regras que estão se tornando a nova ordem na economia global. A recente legislação aprovada pela União Europeia impede, por exemplo, importações de carne proveniente de áreas desmatadas após 2020 e que não respeitem a legislações ambientais e sociais relevantes, o que dá o tom do quanto o mercado está sensível e vigilante em relação às boas práticas. Quem não seguir essa tendência, vai perder espaço, perder mercado e a chance de fazer parte dessa nova economia.

Um dos maiores importadores da carne brasileira, a China também tende a suprimir de seus negócios a carne bovina ligada ao desmatamento ilegal. Por pressão de setores privados, o governo chinês acena com leis de proibição de importações e exportações ilegais. Reino Unido e Estados Unidos também se movimentam nessa mesma direção, forjando uma nova rota no comércio mundial de commodities.

Aqui no Brasil, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) estabeleceu recentemente seu protocolo de boas práticas para o setor da pecuária, segundo o qual os bancos vão passar a exigir dos frigoríficos da Amazônia Legal que comprovem que não compram gado de área de desmatamento ilegal para conseguir financiamento. A medida valerá a partir de dezembro de 2025.

A redução de riscos de ilegalidade na pecuária brasileira, porém, não pode mais ficar restrita à região amazônica. Precisamos incluir os outros biomas, em especial o Cerrado

com sua fronteira agropecuária em expansão. Com o novo cenário criado com o acordo de cooperação com a ABIEC, é possível ter esperança de que o país seguirá alimentando o mundo, mas cada vez mais em uma perspectiva que leva em conta – de fato – a natureza e as pessoas.

*O artigo é assinado por Marina Piatto e Lisandro Inakake, coordenador de Cadeias Agropecuárias do Imaflora

Acompanhe tudo sobre:AgropecuáriapecuáriaSustentabilidadeExame-AgroAgronegócio

Mais de EXAME Agro

Sorgo e canola: a próxima empreitada da 3tentos no setor de combustíveis

União Europeia aprova adiamento em 12 meses da implementação da lei 'antidesmatamento'

Enquanto Defesa entra no debate, ministérios do agro devem escapar de corte de gastos